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sexta-feira, março 09, 2012

Gabriel & Cia entrevistam Parreira, o Vigarista!


Pois é, agora não tem mais jeito: tô condenado a vagar eternamente por essa Terra cheia de malucos. Mas isso até que não é tão ruim e tem lá as suas compensações: a cerveja aqui é boa, já me habituei às comidas estranhas e as mulheres, quando usam chicotes, quase que me devolvem ao Céu. Difícil mesmo é quando me botam pra entrevistar gente do tipo desse Claudio Parreira, que se diz Vigarista. Ainda bem que não tô nessa sozinho. Vamos, então, direto ao assunto:



GABRIEL — Tô meio confuso e gostaria que você me esclarecesse uma coisa: até onde eu sei, sou obra do Criador. Mas agora tão dizendo por aí que você me criou. Como é isso?
PARREIRA — O arcanjo Gabriel, se é que ele existe mesmo, sim, foi coisa do Criador, do Supremo. Já você, o anjo Gabriel, é fruto da minha imaginação. Sou, portanto, o seu criador. Por isso, ajoelha e me adora!
GABRIEL — Vai à merda!
PARREIRA — Perfeitamente. Quer saber algo mais?
GABRIEL — Você escreveu um livro que mistura humor, putaria e reflexão filosófica. Não é uma combinação um tanto inusitada?
PARREIRA — Você sobreviveu, não é? E curtiu, que eu sei. Não tem nada de inusitado ou incomum nisso. É apenas literatura.
EMBAIXADOR — Literatura... Praga dos infernos!
PARREIRA — Tá reclamando do quê? Foi a literatura que te trouxe ao mundo, à luz. Imortalizei você nas páginas de um livro e na imaginação dos leitores.
EMBAIXADOR — Mas me esculachou! Todos esses leitores aí pensam que eu não passo de um bebum delirante.
PARREIRA — Embora o livro se chame Gabriel, você é um dos personagens mais interessantes da trama, tanto que deixei pra você a conclusão dessa porra toda. Brilhante, Embaixador, você é brilhante!
MARIA — Vocês ficam aí falando, falando, mas esquecem de que, sem mim, nada disso teria sido possível. Não fui, afinal, a escolhida?
PARREIRA — Você é a prova de que nem sempre as escolhas do Supremo são sensatas.
MARIA — Seu... seu... vigarista!
PARREIRA — Obrigado, querida.
GABRIEL — Vocês estão desviando do foco. Isso aqui é uma entrevista, porra!
PARREIRA — Então pergunta, carái!
GABRIEL — O padre Gerôncio é uma figura muito controvertida no meu romance, quer dizer, no seu romance. O que você quis dizer, ou provar, com um padre ateu?
PARREIRA — O Gerôncio não é ateu. Ele é à-toa, um sujeito que, mesmo tendo se dedicado ao sacerdócio, não se deixou contaminar pela baboseira católica.
GABRIEL — Você não tem medo de tocar em assuntos tão complexos? Não teme represálias por parte da Igreja? Em outros tempos, você seria considerado herege.
PARREIRA — Eu sou um sujeito contemporâneo que lida com questões contemporâneas. A discussão que se desenvolve em Gabriel é atualíssima. Se a Igreja ainda está na Idade Média, isso é um problema dela. E acho também que essa é uma das funções principais da literatura: incomodar. Fazer pensar. Esse é o meu foco.
EMBAIXADOR — Você pode nos dizer como é o seu fazer literário, como escreve, se tem algum ritual?
PARREIRA — Gosto de escrever de manhã, com uma xícara de café e cigarros à mão. E escrevo de cueca ou pelado, dependendo do calor.
VERMELHO — Qui diliça...!
GABRIEL — Errrrr, o que é que você acha de ser entrevistado pelos seus próprios personagens?
PARREIRA — Tô gostando dessa conversa. Isso prova que os personagens acabam ganhando, mesmo, vida própria, independente da minha opinião. Vocês todos agora estão no mundo, já não me pertencem mais.
GABRIEL — Como foi o processo de edição?
PARREIRA — Dei muita sorte: assim que concluí o livro, encontrei a Editora Draco. Arrisquei mandar os originais e funcionou. O que aconteceu daí pra frente vocês sabem tão bem quanto eu.
EMBAIXADOR — Mas os leitores não sabem...
PARREIRA — Explicar aqui todo o processo editorial seria muito cansativo, mas posso adiantar que tudo correu da melhor maneira possível. E o resultado disso tudo já não me cabe mais avaliar. Isso agora é com os leitores.
GABRIEL — Você parece que tá fugindo do assunto.
PARREIRA — E você parece questionador demais. Que saco!
GABRIEL — Não foi você que me criou assim? Então não reclama, porra!
PARREIRA —...
GABRIEL — Tem algum conselho, alguma dica para os escritores iniciantes?
PARREIRA — Apenas isso: escrevam!
GABRIEL — Uma pergunta que muita gente deve fazer por aí: por que Vigarista?
PARREIRA — Viver de literatura no Brasil é impossível. E escrever, como costumo dizer, é um ofício de trevas: você vive às escuras, nunca sabe exatamente o que faz — e se o que faz vai virar alguma coisa concreta. Por isso a vigarice: a gente vive de bico, pequenos trabalhos, ou trabalhos que nada têm que ver com a nossa verdadeira vocação literária. Eu preciso pagar a porra da conta de luz, o aluguel. A literatura é uma atividade quase clandestina. Só mesmo sendo um vigarista pra dar conta disso tudo e ainda escrever satisfatoriamente.
GABRIEL — São suas últimas palavras?
PARREIRA — Não, não mesmo. Ainda pretendo falar muito e escrever muito mais.
VERMELHO — Essa entrevista já tá enchendo o saco. Que inferno!
EMBAIXADOR — Disso você entende bem, né?
MARIA — Querem parar com essa briga? Que falta de respeito com os leitores!
PARREIRA — Só queria saber uma coisa: quem foi o cretino que te encomendou essa entrevista?
GABRIEL — Um sujeito desclassificado, um tal de... Tavares, acho.
PARREIRA — Rochett Tavares?
GABRIEL — Isso! Esse mesmo.
PARREIRA — Só mesmo ele pra inventar esse tipo de maluquice. Filodaputa!
GABRIEL — Respeita o homem!
PARREIRA — Vai à merda!

Como vocês puderam ler, a partir deste ponto ficou impossível prosseguir com a entrevista. Esse Parreira aí não vale nada, é um vigarista mesmo — da pior espécie. Sua única virtude, talvez, tenha sido escrever o livro que leva o meu nome. Mas não confiem nele: gente assim tá sempre tramando alguma coisa, escondendo um texto na manga, conspirando contra a moral e os bons costumes. Vai ver é por isso que gosto tanto do cara.